IPVA - naufragand o no mar da ignorância
por Fernando Previdi, analista de sistemas, largou carreira e vendeu a casa em São Paulo para morar a bordo de um barco; colaboração e revisão por Norberto Marcher Mühle, consultor jurídico e velejador
Você concorda com a criação de uma TAXA ANUAL para manutenção das ruas, avenidas, pontes, viadutos,
semáforos, faixas de pedestre, passarelas, órgãos de engenharia de tráfego e para o custeio de muitos outros gastos e
mazelas que os Automóveis causam para a Sociedade e para a Administração
Pública??!
NÃO?
E o que tal cobrar IPVA dos
barcos que NÃO usam tais vias e infraestruturas públicas?!
Ah, mas você acha que
"barco" é coisa de "milionário" e por isso tem mesmo é que
pagar muito imposto independente de qualquer lógica???
Se você concordou com a última
afirmação então sugiro que leia esse texto com atenção, e que pesquise melhor
sobre o assunto, você pode estar redondamente
enganado e cometendo uma tremenda injustiça...
Seria cômico se não fosse trágico...
como é que alguém no Brasil ainda tem coragem de apoiar o aumento de impostos?
Com uma tremenda inversão de valores, no ápice da
insatisfação da sociedade com nosso podre e ineficiente governo – onde os
altíssimos impostos financiam os mensalões, privatarias, cartéis e afins – espertalhões
de plantão se aproveitam do momento político para confundir e por em prática, “às
pressas”, uma proposta nefasta e danosa para
o setor náutico, com enorme potencial de causar ainda mais distorções,
injustiças e até desemprego.
Sobre o IPVA, cabe lembrar que:
- O IPVA foi criado na
Constituinte de 88 para substituir a
antiga TRU (Taxa Rodoviária Única), passando claramente para os Estados a
autoridade de tributar os veículos que circulam em vias públicas (terrestres, é
óbvio), determinando que 50% das receitas devem ser transferidas ao município
onde o Veículo está “licenciado”, cabendo a esses (municípios e estados) a
obrigação de cuidar das vias de tráfego, do transporte público e todo o sistema
e infraestrutura exigida pela utilização dos tais "Veículos
Automotores" (Terrestres e que circulam em vias públicas, É ÓBVIO) como
ruas, avenidas, pontes, viadutos, estradas, semáforos, faixas de pedestre,
passarelas, órgãos de engenharia de tráfego e muitos outros custos/investimentos
PÚBLICOS necessários ao uso de tais bens;
- A cobrança do IPVA aplica-se
(hoje) exclusivamente aos VEÍCULOS que circulam
em Vias Públicas Terrestres como: carros, motocicletas, ônibus, caminhões e
outros "veículos" devidamente emplacados e licenciados. Não se cobra
"IPVA" dos tratores, colheitadeiras, empilhadeiras, carros/motos de
competição, trens/metrôs e nem mesmo de carros/motos que circulam
exclusivamente em propriedades particulares. Também não se cobra
"IPVA" dos "elevadores" que são de fato "veículos
automotores". Se nos apegarmos ao "termo genérico", muitos
outros bens/objetos poderiam também ser tributados, bastaria apenas a
"fome" do legislador e a conivência da sociedade;
- Através de rastreamento dos
radares implantados nas vias públicas (terrestres, obviamente) o Estado de São
Paulo vem cruzando os dados do DENATRAN e identificando os veículos Licenciados
em outros Estados, e usando tal informação como base para justificar a cobrança
do IPVA em favor do Estado de São Paulo, deixando mais uma vez clara a correlação do Imposto com a circulação dos
Veículos nas Vias Públicas Terrestres.
Alguns dos motivos que fazem da
"proposta" de se cobrar "IPVA" de Barcos um absurdo:
- Observa-se em nossa
CONSTITUIÇÃO o fato de que a legitimidade para Legislar sobre a navegação
marítima/fluvial e transporte aquaviário compete
exclusivamente à União (e não aos Estados), lembrando o que citamos acima
de que por Lei o que se arrecada com o IPVA é distribuído entre o Estado (50%)
e o Município (50%) de onde o Veículo está "Licenciado" (não existe
"Licenciamento" de barco), não
cabendo nenhum repasse à União e/ou Marinha e Capitania dos Portos.
- Ainda ao observar a
Constituição Federal e também outras Normas/Leis
pertinentes, vê-se claramente o uso
do termo "Veículo Automotor" referindo-se exclusivamente aos Veículos
Terrestres, assim como a completa ausência do uso desse termo para
referir-se a Barcos ou Aviões, esses sempre sendo referenciados nas Normas
pertinentes de forma clara e objetiva como "Embarcações" e
"Aeronaves".
- Por fim observa-se ainda o
Código de Trânsito Brasileiro, que é usado por alguns "defensores" da
extensão da cobrança do IPVA para Embarcações (o puxadinho tributário),
definindo o "Veículo Automotor" como: “todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios,
e que serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a
tração viária de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas”;
porém tais defensores omitem
(de forma leviana ou por falta de perícia/competência) o que determina o
Capítulo 1 (Disposições Preliminares) do mesmo Código: “Art. 1º O trânsito de qualquer natureza nas VIAS TERRESTRES do território nacional, abertas à circulação, rege-se
por este Código.” (O QUE DE FORMA INDUBITÁVEL “EXCLUI” AS EMBARCAÇÕES).
Analisando os pontos acima compreende-se
os motivos de o Supremo Tribunal Federal
(STF) ter JULGADO como INCONSTITUCIONAL a cobrança do “IPVA” das EMBARCAÇÕES,
ao apreciar as Leis Estaduais (de alguns Estados) que, aproveitando-se do texto
genérico de nossa Constituição (Veículos Automotores), tentaram realizar tal
cobrança.
O que se vê agora é ainda mais asqueroso:
a tentativa de mutilar nossa Constituição aproveitando-se do momento
político conturbado para, no susto e no grito, e ao arrepio do que determina um
Estado Democrático, passar por cima das Leis e dos princípios básicos de
civilidade. Observa-se claramente na medida a tentativa de usar o
"jeitinho brasileiro" aproveitando-se de "brechas" (o puxadinho)
com fins exclusivamente
arrecadatórios, sem se importar com as consequências que podem
causar a um determinado setor da sociedade.
A atual proposta de cobrar
"IPVA" de EMBARCAÇÕES (e Aeronaves) é de iniciativa do Sindifisco
(Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal), levadas adiante por dois
deputados do PT através de PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que tramitam
no Congresso através dos números PEC 140/2012 e PEC 283/2013, com o "pomposo"
apelido de "PEC dos Jatinhos",
mas que no fundo só escondem objetivos maliciosos de aumentar (AINDA MAIS) a Carga
Tributária do nosso país, usando de artifícios sórdidos para requentar
um Imposto que, como já vimos, aplica-se e é compatível apenas aos
"Veículos Automotores Terrestres que circulam em Vias Públicas".
Além do "apelo populista",
demagógico, com o apelido que "confunde"
(e engana) a população, a proposta incita o preconceito, a inveja
e a “luta entre classes/grupos”.
Essa fórmula vem se consagrando no país, sendo usada com certa frequência em outros
temas debatidos na sociedade, percebida na comunicação maliciosa, tendenciosa e
rasa, claramente identificada em algumas revistas, Facebook, Twiter e outros
meios de comunicação. A armadilha é óbvia, coloca-se um grupo da sociedade
contra outro com um objetivo exclusivo (e minuciosamente planejado) de se
atingir o resultado sórdido, nesse caso, como percebemos, é o aumento da carga tributária.
A proposta ainda é defendida como
"justiça tributária/fiscal"
através da artimanha de
comparar uma EMBARCAÇÃO de "ESPORTE e RECREIO" com o Automóvel usado
nas grandes cidades para ir e vir, comparação que a luz dos fatos se prova
absurda e sem nexo.
Apela-se para a reação emocional da "grande
massa" levando as pessoas ao erro, incitando a população a indignar-se com
os proprietários de Embarcações colocando-as na mesma pauta que um
"Jatinho", como se todo dono de BARCO fosse "milionário", e
pior do que isso, com comparações grosseiras e levianas como a que encontramos
no site do Sindifisco: "Quem tem
carro popular paga IPVA. Mas banqueiro e dono de jatinho não pagam” – O QUE TEM A VER O "BANQUEIRO" E O
"DONO DO JATINHO" COM O PROPRIETÁRIO DE UM VELEIRO OU LANCHA DE
PESCA, ESPORTE OU RECREIO??
É o mesmo que culpar o gandula
pela derrota no campeonato... mas com manipulação e retórica fazem absurdos, e
com “consentimento popular”, assim Hitler viabilizou o Holocausto, assim
crucificaram Cristo.
Quem conhece o setor Náutico sabe
que mais de 95% das aproximadamente
70 mil embarcações registradas no Brasil não
são bens de luxo e sim objetos
de esporte e recreio, a maioria com tamanho inferior a 26 pés (8
metros), outras construídas artesanalmente para realizar travessias oceânicas,
pesca amadora e para fins de habitação, ou seja, são barcos relativamente
simples, acessíveis a muitos que, movidos por um sonho, se disponham a nessas
embarcações aventurar-se, e não
“megaiates nababescos e ultraluxuosos, palácios flutuantes” como sustentam o
projeto e grande parte da mídia preconceituosa.
Não há dúvidas de que a grande maioria dos proprietários de
barcos não são milionários,
mas sim aventureiros, esportistas e sonhadores que com muito esforço compram
(OU ATÉ MESMO CONSTROEM) seus barcos para realizar sua expedição de exploração
oceânica mundo a fora, curtir a aposentadoria ou simplesmente para pescar ou
passear com a família no fim de semana.
Com a proposta em questão, quem perde é o cidadão comum, da
classe média e média-alta (entendendo que "ainda" não seja um crime
prosperar honestamente nesse país), aquele que sempre pagou impostos nas
alíquotas mais altas, vendo sua renda mensal ser "amputada" pelos
27.5% de IR, e adicionalmente pagando de forma direta e indireta mais de 40% de
imposto ao comprar (ou construir) sua própria embarcação. É esse que agora
se vê encurralado por uma proposta que inviabiliza seu "Esporte e
Recreio", que decreta como "crime"
o seu "estilo de vida", o seu sonho.
Antes esse infeliz proprietário
tivesse optado por gastar o seu dinheiro com os badalados pacotes de viagem ou
em cruzeiros internacionais... ao invés disso ele investiu em uma embarcação, gerou
empregos para a indústria naval brasileira, pagando de forma privada todos
os custos do seu esporte/lazer (sem nenhum benefício ou contrapartida do
governo).
Agora os proprietários de embarcações,
autônomas, sem dependência dos investimentos do Governo e de infraestrutura
pública, correm o risco de serem extorquidos
com a cobrança de um imposto anual SEM SENTIDO que em alguns Estados pode
chegar a 5% (ao ano), algumas vezes num momento de vida onde tais
proprietários não possuem uma farta fonte de renda, como na aposentadoria
ou durante uma expedição de exploração oceânica, ou seja, torna-se a cobrança, para esses, simplesmente impagável.
A cultura náutica no Brasil vem crescendo nos últimos anos
(com a ascensão da renda da classe média), mas ainda é absurdamente pequena
considerando o enorme potencial natural do nosso país. Comparando o setor
brasileiro com realidades de outros países, até mesmo com a Argentina, percebe-se
que o Brasil de fato “dá as costas” para o mar, despreza seus rios, represas e
afins, riquezas que são generosamente (e GRATUITAMENTE) ofertadas a todos pela Natureza, e que são usadas quase que exclusivamente para o despejo de esgoto.
A total falta de conhecimento
do assunto e o preconceito
são os principais ingredientes dessa tragédia.
Com a Proposta em questão (PEC) a
tendência é que o problema se agrave
ainda mais, excluindo de vez
do mar, rios e represas, e também das explorações oceânicas, a classe média do nosso país.
Tais aventuras e riquezas ficarão para uso exclusivo das nossas
"elites", esses que os defensores da proposta "dizem"
querer tributar, mas que na prática só serão beneficiados com tal iniciativa, até
por que para esses, que muito facilmente já "fogem" do Imposto de
Renda (IRPF), camuflados por seus "CNPJs", vão fugir também desse
NOVO IMPOSTO tendo em vista a forma amadora e rasa como o assunto está sendo
tratado.
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